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Véu, grinalda e tênis de corrida

Eu não sei como isso começou, mas alguém me inscreveu na corrida pelo altar e eu não fui nem informada. Pode ter sido a era balzaquiana, que bateu na minha porta. Ou meu relógio biológico que já faz tic-tac. Ou ainda a quantidade de ex-namorados que já achou a sua cara metade. Talvez porque a cada encontro de família eu ainda receba o olharzinho de “óh, coitada, ainda solteira”. Pode ser que seja culpa do meu pai, atrapalhado que só ele nos assuntos do coração, jogando aquela bomba de “olha… quem muito escolhe, acaba não sendo escolhida”, ou ainda por conta da minha mãe dizendo “agora vai hein?” a cada primeiro encontro de um novo affaire. Meu status social virou lepra, foi isso? Esqueçam todas as minhas conquistas, MBAs, carimbos no meu passaporte, meus planos de vida. Socorro, temos uma solteira no recinto!

Gente, calma, eu quero casar. Quer dizer, eu ACHO que eu quero casar. Eu imagino meu vestido branco e os 12 kg que quero perder para entrar nele. Da grinalda e do véu grudando no meu batom. Penso em caminhar por uma igreja mentalizando “não tropeça, não tropeça” segurando a mão do meu pai, enquanto ele sorri um sorriso de alívio. Eu me imagino me jogando nos braços de Mr. Right e grudando nele um beijo apaixonado logo depois do “eu aceito”. Eu já tenho sete (sim, 7!) versões da primeira dança, todas coreografadas na minha cabeça (a metade delas com trilhas apaixonantemente bregas como Chitãozinho e Xororó e Bruno e Marrone – me julguem!). Da chuva de prata caindo em cima o bolo. Já planejo colocar meus parentes bêbados em seus transportes depois do fim da festa. Penso no meu novo marido desabotoando os 714 botões do meu vestido antes da noite de núpcias. E todas as delicias e desafios que envolvem colocar aquela aliança no meu dedo. Então veja, eu penso nisso. Mas dá pra parar de me empurrar?

É muito estranho. Estou vivendo uma fase de ouro da minha vida, e ainda assim é como se eu estivesse atrasada. Talvez eu esteja gozando da última coleção de momentos em que eu possa ir e vir ao meu bel prazer, e eventualmente isso faz de mim uma individualista moderninha. Ora, mas por quê? Não que hoje eu não deva satisfações, eu sempre respeitei a opinião dos meus amores (família, amigos, romances), mas no modus operandi que estou, talvez seja a última vez que eu não dependa destas opiniões para tomar um rumo. Eu quero pedir demissão, eu peço, pois o orçamento familiar ainda é só meu. Quero vender meu sofá e gastar tudo em sapatos, eu posso, o sofá é meu. Decidi me mudar pra Londres e seduzir o príncipe Harry? De novo, um plano única e exclusivamente meu. Tornar-me a sexta integrante das Spice Girl no retorno delas? Posso sim, eu tenho girl power! Tirar um ano sabático pra descobrir o sentido da vida (ou falta dele)? Também posso, pois ninguém depende de mim pra seguir vivendo. E isso não deveria ser problema. Mas aparentemente é. E eu não vejo sentido nesta matemática.

E por falar em matemática, final de semana destes estava na beira da praia e me peguei fazendo contas com a calculadora do celular (juro) de quantos anos ainda tenho antes de tomar grandes e definitivas decisões. Escolher um amor, fazer Antôninhas, adquirir imóveis, melhorar o meu plano de seguros. A tarefa de traçar um cronograma para ser feliz e completa atendendo a todas as expectativas não me deu perspectiva, mas sim um ataque de ansiedade. “Jesus, não vai dar tempo!” – eu pensei. E com a pressa de ser feliz no futuro, me vi comprometendo a alegria de ser feliz agora. Nananinanão. Eu não me inscrevi nesta corrida. E quando achava que ainda tinha minhas dúvidas, o happy hour da semana passada trouxe a notícia de que um antigo grande amor havia se divorciado, menos de um ano depois do casamento. Não comemorei como uma ex namorada amarga, fiquei triste. Muito provavelmente ele também entrara desavisado na corrida, e de agora em diante ele jamais voltará a ser solteiro, e ter essa lepra que possuo. Ele será um divorciado, o que aos 30 e poucos anos, para essa sociedade, talvez seja um rótulo ainda mais complexo do que o meu.

Então veja, não adianta mesmo fazer torcida para eu acelerar o passo, pois enquanto já tem gente enfiando véu e grinalda na minha cabeça nesta corrida pelo altar, eu ainda nem achei meu par de tênis. E se não for pra encarar o desafio bem equipada e respeitando o meu timing, eu prefiro nem correr. Aí eu vou dar uma volta na praia, descalça. Talvez lá eu ache alguém tão despreocupado com essa corrida quanto eu. Então, casamos.


Fim da sessão.

 

Antônia no Divã

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