Eu tenho uma amiga muito louca. Ela é aquela que nunca dispensa uma festa e uma cachaça. Adora falar alto, e ri mais alto ainda. É do tipo de gente que quando chega num ambiente nunca passa desapercebida. Não é nada discreta. Se ela bota purpurina, derrama o pote todo no corpo. Se ela torce pelo seu time, levanta toda uma torcida. Ela é confusão. Gritaria. Tem sempre a casa cheia, uma geladeira abastecida. Me liga na segunda-feira “vem pra cá, quero te ver”, rio do outro lado da linha, “mas amiga, hoje é segunda!” – e ela diz dando gargalhada, “e lá tem dia pra ser feliz, Antônia, chega logo aí”. E eu vou.

Quem não conhece a minha amiga não entende. Tudo que veem é barulho. “Como pode tu andar com essa destrambelhada?”, me perguntam. Mas já diria meu pai, “todo mundo vê o quanto eu bebo, ninguém sabe dos meus tombos”.

A minha amiga, essa louca, não pode ver um cachorro na rua. É daquelas que tem 5 guaipecas dentro de casa, que se juntar tudo não dá meio pedigree, mas que sempre tem lugar pra mais um. Ela acha que amor não ocupa espaço, mas preenche o mundo dela. Já vi gastar mais de um salário mínimo comprando ração, operando cusco dos outros, salvando cavalo de maus tratos. Beija os pulguentos no focinho, aquela louca. Deve ser esse o defeito dela.

Essa minha amiga é muito doida mesmo. Na semana eu jantei na casa dela duas vezes, e ela reclamou quando não apareci no terceiro dia. “Fiz aquela massa que tu gosta”; Expliquei que tinha feito um exame meio zoado, que tava passando mal, e ao invés de me liberar, implorou pra cuidar de mim. “Eu te busco, eu faço sopa. Deixa que cuido de ti.” Ela tem filha, tem marido, tem irmã, ou seja, não é nenhuma desesperada por atenção. Mas ela acha que todo amigo é família, então nada mais justo do que cuidar de mim quando eu não consigo. Deve ser esse o mal estar que ela causa nos outros. Só pode.

A minha amiga essa, adora uma cerveja. Todo mundo critica. Ela paga a cerveja dela. A cerveja e todos os boletos, mas o povo fala. Acha que a alegria dela é exagerada, porque afinal, como pode alguém ser feliz o ano inteiro. Ela não é. Tem problemas, sofre, leva tombo. Mas como o meu pai diz, tem gente que só enxerga as cachaças. Ninguém lembra que ela reúne doações pra faxineira do banco onde ela trabalha, quando a mulher perdeu tudo num incêndio. Mas todo mundo sabe que ela ama Itaipava e que é louca. Muito louca. Altruísmo, essa coisa feia,  deve ser o esse o defeito dela.

Ela nunca diz não para quem precisa. Ama profundamente quem tem por perto. É feliz como se o mundo fosse acabar amanhã. Mas eu ainda tenho que explicar pra quem não a conhece que ela é gente boa. Da melhor qualidade. Porque as pessoas tem dificuldade de ver além do barulho. Além da euforia. Acha que gente feliz, gritalhona e que dá risada, bom sujeito não é. Boa coisa não faz. É companhia mal quista. Persona non grata.

Quando é pra chorar a minha amiga se desmancha do meu lado. Quando é pra rir, cai pra matar mesmo. Rebola a bunda sempre que toca sua musica preferida, não importa se é no boteco ou no supermercado. Junta o povo. Branda amor por onde passa.

E sempre tem quem pergunte o que eu faço do lado dessa louca. Você pode entender. Respondo com um sorriso no rosto, que gente normal me entedia. Que eu gosto mesmo é das loucas, que como eu, não tem medo nenhum do que os outros vão dizer enquanto a gente só tá fazendo o bem, e tentando ser feliz.

Amiga, você é louca. NUNCA MUDE.


Fim da sessão.

Antônia no Divã

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