A vida moderna da mulher solteira
Ou seria a vida solteira da mulher moderna?
Lembro que o primeiro sentimento que me ocorreu depois de acessar o fracasso do meu relacionamento, foi o desespero de pensar na trabalheira de ser solteira de novo. É tipo voltar a investir no mercado. Um jogo de alto risco. Antes teu investimento tava num fundo sólido, com rendimentos mensais confiáveis (até que alguém prove o contrário), e você tinha a tranqüilidade de que seus interesses estavam protegidos. Ser solteira é tipo investir em bitcoin. Todo mundo se diz confiável e cheio de rentabilidade, mas do nada você descobre que tudo não passava de uma pirâmide, e alguém mais rápida que você levou o melhor do investimento. Ou não. Ou descobre que aquele fundo de renda-fixa não chegava aos pés da bolada que rendeu investir em outras fontes. Investir, de qualquer forma, é pra quem tem coragem e paciência, afinal.
É foda. Eu lembro quando meus anseios eram resumidos ao cara ser surfista, ter todos os dentes na boca e um pau de tamanho socialmente aceitável. Agora dentre as minhas muitas preocupações de mulher adulta, incluem o quanto o pretendente depende da mãe depois dos 30, qual a sua inclinação política, se ele pretende ter família, ou pior, se acredita que a Terra é plana. Já parou pra pensar como um pau socialmente aceitável pode não ser mais tão importante, se o cara não acredita em coisas como (uma vida de embasamento científico que defende o potencial das) vacinas? Ser solteira já foi mais fácil.
E não é só o processo seletivo que ficou mais complicado. O acesso ao mercado já não é mais tão óbvio desde os últimos 2 anos que fiquei fora dele. Minha amiga contava de um carinha gato que andava conversando, e quis saber onde eles se conheceram, quando ela entregou o ouro: no Instagram. “Ele começou a me seguir, comentou minha foto e estamos há semanas conversando”. Outra amiga foi a um date com um carinha que lhe deu uma “chuva de likes” e os dois estavam se entendendo. Vocês tão sabendo que o Instagram é o novo Tinder? Pois eu descobri recentemente. “Amiga, agora que tu tá solteira, tu tem que postar mais selfies” – alguém me recomendou. E era só o que me faltava mesmo. Eu uso minhas redes profissionalmente, eu passo o dia agendando publicações, pensando na melhor legenda pro cliente, no melhor ângulo da foto, na chamada a ação, e qual não foi a minha surpresa ao descobrir que a felicidade do meu clitóris (e coração) dependem hoje, justamente da mesma análise. #exaustão
Eu não sou boa em selfies. Eu odeio usar o inbox do Instagram. Eu não tenho capacidade de ser sedutora em 15 segundos de stories. Sou daquelas que atrai os caras pela personalidade, depois é que eles descobrem que eu sou sexy. Depois. Primeiro eu faço eles rirem, depois ficarem com vontade de me comer. Eu não consigo fazer o contrário. Com certeza que deve ter um tutorial no YouTube para isso, ora, hoje se aprende tudo com youtubers. E talvez eu deva me informar mesmo, afinal, ninguém aqui tá ficando mais nova. Minha ginecologista faz questão de lembrar-me disso. E não é porque eu peguei num sono na recepção do consultório dela, provando que eu já cheguei na idade de dormir em lugares públicos. “Planos de engravidar?”, “nenhum, só de transar mesmo”, “mas tu não estavas noiva?”, “estava, ele mudou de ideia”, “boa ideia foi a tua do DIU, não é mesmo?”, “a melhor”, “sempre podemos pensar em alternativas, reprodução independente, congelamento de ovos, afinal tu JÁ tem 34, e a tecnologia está a teu favor”.
Será? Será mesmo que a tecnologia está a meu favor mesmo?
Com essa oferta desenfreada de relações tão instantâneas e cheias de filtro? Com a reprodução da espécie sempre sendo jogada como uma bomba no nosso colo? Quer dizer, eu nem sei se quero me reproduzir, mas já fico imaginando meus ovos no freezer, do lado da carne moída. Eu nem tô pronta pra me relacionar de novo, mas já me ocupo sobre a minha inabilidade de seduzir uma câmera de celular. Eu me considero super vanguarda para a maioria das coisas, mas talvez eu tenha ficado jurássica para as relações. Sou daquelas que ainda usa álcool como vaselina social, e que se rende a sorrisos presenciais, cordas de violão. Abacaxi picado e walk of shame pela manhã.
Talvez toda essa modernidade sirva para eu avaliar meus investimentos com mais calma, afinal, mesmo com anos no mercado, meus rendimentos tem se resumido a muita experiência e pouco retorno. Sendo assim, eu não me imagino colocando mais fichas em tendências voláteis e modas da vez. Eu estou exausta das variações do mercado. Então talvez por hora, eu desista de achar meu par, e arrase sendo ímpar por um tempo.
Fim da sessão.
silvia
Procurando ser impar também por um tempo.
Fernanda
Estou nesse exato momento! Adorei o texto
Nathalia Rodrigues
Tão bom perceber que não sou a única no mundo. Me aflige todos os dias que o tempo está passando e me consumindo e nada de me perceber ao lado de alguém. Já estou encarando melhor a ideia que eu serei a tia legal que vai levar os sobrinhos para a Disney,
DULCE MARIA RODRIGUES LAGOEIRO
Pois é… Eu desisti, não quero mais saber de relacionamentos, gente grudada em mim….estou bem do jeito que estou mas….tenho 75 e você 34…mesmo idade não sendo sinônimo de tesão, os seus hormônios são mais ativos que os meus…por isso, insista, mais uma vez! Beijos!
Roberta
Adorei, como todos os outros posts.
Parabéns!!!!