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Querido Papai Noel

Chegamos à marca dos 30 dias para o Natal, e peguei-me mais uma vez pensando se havia sido uma boa menina durante o ano. Avaliei as intenções do meu coração, revisei as minhas atitudes e por último comparei tudo isso com a lista de pedidos que fiz a você. Papai Noel, pode ser que você não se lembre da minha carta do ano passado, pois eu também demorei a recordar. No ano passado, foi a primeira vez em que não te escrevi. Não mesmo – pode conferir. Diferentemente de todos os outros anos, eu não te pedi nada. Ao invés disso cancelei qualquer presente que tivesse o meu nome, pois na ocasião me declarava afortunada o suficiente para receber mais graças. Não houve carta, Barbudo. Apenas uma foto, pode olhar no meu Facebook. Uma foto da minha família, entre muitos sorrisos, sentada na escada aguardando a ceia – na legenda dizia: “Papai Noel, cancele os meus presentes, eu já tenho tudo que preciso. Obrigada”. Lembrou agora? Eu era a garota feliz daquela foto.

Pois é Papai Noel, hoje, no entanto, eu já não contemplo tal plenitude, e você sabe por quê. A foto deste Natal, ou de qualquer outro natal, não terá nunca mais a minha família completa. Confesso, Bom Velhinho, que agora me sinto um pouco traída por não ter te pedido nada no ano passado. Talvez devesse ter pedido muitos outros anos de fotos de famílias completas esperando a ceia. Na ocasião me pareceu mais do que justo apenas te agradecer, e foi o que fiz. Eu só agradeci. Ora, pois neste ano eu vou precisar de uma ajudinha, você entende. Sei que tu não podes me conceder a graça de voltar no tempo e ter de novo aqueles sorrisos. No lugar deles, fiz uma listinha de pedidos para o Senhor avaliar. Juro que não pediria nada novamente, se não estivesse realmente precisando. Aí vai:

Papai Noel, conceda alivio para a minha mãe e para todas as mães do mundo que sofrem com a ausência de um filho. Por favor, Papai Noel, não poupe esforços para cuidar das mães. Entenda que para elas cada filho é único, e a falta de qualquer um deles é um desalento insuportável de se presenciar. Guarda com carinho todas as suas lembranças, cada colinho, cada beicinho. Cada sopro de joelho ralado. Não as deixe esquecer cada abraço apertado, e minimize a ausência de todo abraço que não mais houver. Cuida das mães – porque sem elas, o mundo que já tá difícil, perde toda a esperança. Cuida da minha mãe, eu lhe peço. Traz de volta o brilho do olho verde dela, pois sem ele a minha vida perde um pouco o sentido.

Papai Noel, proteja o meu pai e todos os pais do mundo e os absolva de suas culpas irracionais. Você como pai deve saber que os pais sempre acham que podiam ter amado mais, protegido mais, sido mais presentes. Explique a todos eles, Papai Noel, e em especial ao meu pai, que eles não erraram conosco. Porque se erraram foi sempre tentando acertar. Mostre a eles que nos amam como podem, e que seus filhos entendem – mesmo quando não entendem. Cuida do meu pai, para que ele possa me enxergar mesmo em tempos mais sombrios, e que ele nunca se esqueça de que eu sou a menininha dele, e que vou estar sempre ao seu lado.

Papai Noel cuida dos nossos amigos. Fortaleça as asas daqueles anjos altruístas que não pensam duas vezes em pular no penhasco da dor para nos buscar. Que nos sorriem mesmo com o coração despedaçado, e rezam por nós quando a nossa fé silencia. Não deixe que eles desistam de nós, Papai Noel, pois reconhecemos que seu fardo é pesado, e sua caminhada é longa.

Papai Noel proteja a inocência dos meus irmãos e de todas as crianças do mundo. Sabe, cara, os anjinhos lá de casa só têm cinco aninhos e adoram você. Dá uma forcinha pra gente, e protege a doçura deles. Eles sofrem vendo nossas lágrimas com pesar de gente grande. Aliás, eles e todas as crianças sofrem com intensidade, frente às dores do mundo, e como nós, padecem inconformados. Eles trocariam seus presentes de Natal por nossa alegria de volta, isso eu sei. São novos demais para a saudade ou adversidade. Ajuda a preservar a magia do Natal, data em que se diz que tudo é possível, já que pra maioria dos adultos, a tarefa parece cada dia mais impossível.

Papai Noel dá um pouco de compreensão para essa terra. Mande-nos kits de diálogos construtivos. Atitudes bondosas. Energia pros bons corações. Papai Noel, esse ano foi pesado. Faz-nos acreditar que as coisas vão melhorar, rios vão voltar a correr, fronteiras vão se abrir e a intolerância irá se calar, de vez e para sempre. Papai Noel, faz-nos acreditar que vale a pena escrever-te cartas com nossos melhores desejos, por favor. Não sei como é aí no Polo Norte, mas no resto do mundo sinto que nossa fé está abalada. Ajude-nos.

E Papai Noel, sei que meu pedido está em cima do laço, e que seus elfos devem estar ocupados com pedidos mais importantes. Mas se sobrar um tempinho, ainda que pequeno, lembra-te de mim. Ensina-me a sorrir de novo. Suaviza a minha saudade. Sei que nunca mais vou ser completa, como a garota da foto do Natal passado. Mas se puder, me faz continuar acreditando que o Natal pode ser mágico, e que o ano que começa pode, deve e precisa ser um Feliz Ano Novo.

Fim da sessão.

Antônia no Divã

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Antônia no Divã

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