Todo mundo nu
Parem as máquinas! Tá todo mundo nu.
Quem tem acompanhado as notícias no sul do país, percebeu que na pequena província de Porto Alegre, um movimento está acontecendo. Representantes do naturalismo saíram às ruas com o modelito que a cegonha lhes deu.
O fato de alguns cidadãos de bem saírem pelados pelas ruas, gera obviamente, certo espanto. Até aí tudo bem. Acontece que o nu é tão atípico, que ninguém acredita que a vontade brote do puro desejo por liberdade/libertação. Tão logo enxergamos a pele desnuda, nos pegamos questionando a índole, a causa ou mesmo a sanidade mental de quem tira as roupas. Ora bolas, afinal, fomos treinados a nos tapar – mesmo no país do carnaval.
Isso não é de hoje. Com a chegada da cultura judaico-cristã a Roma e com a conversão do Império Romano ao cristianismo, o nu é abolido primeiramente da arte e o pudor se espalha pelo mundo. O negócio chegou a tal ponto que a igreja teve a coragem de mexer na obra prima de Michelangelo “Juízo Final” da Capela Sistina. Quando Michelangelo entregou sua arte “ousada”, o Vaticano rapidinho chamou um estagiário que cobriu a “dignidade” da obra com o intuito de não deixar ninguém constrangido (ou excitado). Na última restauração do afresco, restaurou-se também a beleza dos corpos nus, para sorte e deleite dos tempos modernos.
Falando-se de Antônia, a igreja que me desculpe (ou não) – o nu sempre me seduziu. Eu amo ficar pelada. “Oi meu nome é Antônia, e eu amo ficar pelada.” – “Oi, Antônia”, ouço um grupo de naturalistas me apoiarem em uníssono. Eu só comecei a usar sutiã porque me vi obrigada, e quando no meu quarto não durmo de roupa nem por decreto. A pauta ganhou ainda mais força para a dona deste divã, quando voei as tranças por terras mais “liberais” – liberais entre aspas porque estamos falando de lugares com monarquias, alemães ordeiros e as populações mais idosas da Europa.
O meu primeiro ensaio de nudismo foi em Majorca, na Espanha. Achei que ia desmaiar quando tirei tão somente a parte de cima do biquíni. “Joguem a boia! Seios descobertos ao mar!” Só tomei vergonha na cara da minha frescura quando vi, às margens daquelas mesmas águas que eu me banhava, uma senhora de uns 80 anos baixar completamente o maiô para lavar a areia do corpo. “É assim que se faz, gata!”, pensei comigo. Ninguém olhou. Ninguém apontou. Era tudo muito natural. Depois disso me atirei na água pelada sempre que pude: Ios na Grécia, La Pedrera no Uruguay, Jelsa na Croácia, e teve também um incidente numa fonte em Roma, mas esse foi sem querer e é assunto pra outra sessão.
Entretanto, de todas estas experiências, nenhuma me marcou mais do que a minha primeira tentativa de um banho de sol, completamente pelada e em público.
Estava em Munique, e depois de algumas sugestões resolvi visitar o Englisher Garten que era um must-see da região da Bavária. Passei pelo enorme Residenz, pela Surfer’s Wave (uma onda eterna formada pela queda de um rio para a alegria de lindos surfistas alemães), para então entrar na Nude Beach – um jardim/parque enorme destinado ao nudismo.
Lá, pessoas totalmente nuas espreguiçavam-se ao sol. Eu, neste caso, era um misto de surpresa e vergonha, e ficava me perguntando como eles não queimavam as suas.. ãhn.. partes mais delicadas.
Decidi não ser crítica, e ser corajosa. Escolhi um lugar longe o suficiente das áreas de passeio (onde as pessoas vestidas passavam), e me despi completamente. Atirei a minha canga e num pulo me joguei de bruços. Optei deitar de bruços porque, confesso, eu não estava pronta psicologicamente para um frontal completo (e também porque meses na estrada não me deram tempo para visitar uma depiladora). Mas estava lá. Firme (nem tanto) e forte!
O sentimento foi estranho, reconheço. Lembro que pensava na minha educação católica, e como esta talvez tivesse feito de mim mais puritana do que eu gostaria de admitir. Mas tudo bem. Fiquei lá tentando ficar confortável, até que algo chama a minha atenção. Na área de nudismo havia um gordinho caminhando completamente vestido em torno das pessoas nuas. “Maluco”, pensei, já sentindo-me parte da comunidade naturalista. O cara fica a poucos metros de mim. Analiso a situação e vejo que havia inúmeras pessoas em minha volta, ou seja, não havia porque me sentir ameaçada. Continuei trabalhando no meu bronzeado. O cara então passa por mim de novo, e desta vez diz algo em alemão. Eu, por minha vez, agradeço não ser capaz de entender.
5min depois, quando eu estava realmente começando a desfrutar da arte de bronzear minha bunda incrivelmente branca, o companheiro alemão está de volta, e desta vez ele quer fazer contato. Ele se abaixa e diz alguma coisa em alemão. Levanto a cabeça, tentando entender e ao mesmo tempo desviar do sol que batia nos meus olhos, cegando-me completamente. Quando finalmente venço minha cegueira momentânea, desejo ter os olhos engolidos pela terra. O cara, que antes estava vestido, estava sem calças. Não só isso, abaixo de sua grande barriga, seu pênis está na altura dos meus olhos, perto o suficiente para ser tocado. Mas isso não era tudo: aquele era, sem sombra de dúvidas, o menor pênis que eu tinha visto na minha vida. Uma tímida-pequena-cabeça, não mais do que alguns cms, olhando para mim. Em seguida, começa o que eu vou lembrar para sempre ter sido a conversa mais estranha que eu já tive:
Pequeno Fritz: “Então, você é americana?” (Eu acho que ele não havia notado minha canga da bandeira do Brasil logo abaixo da minha bunda branca).
Antônia: “Não, brasileira.”
Pequeno Fritz: “Então o que você achou?”
Antônia: “Por favor, diga-me que você está falando sobre o tempo.”
Pequeno Fritz: “Haha. Sim. Você está gostando? “
Antônia: “Eu estava… até agora.”
Pequeno Fritz: “Ok, só parei para dizer ‘oi’. Aproveite Munique! “
Antônia: “Danke”.
Era isso. Fora menos de 1 minuto de bate-papo, mas eu decidi que era o suficiente para a minha primeira experiência de nudez – principalmente envolvendo certas… pequenezas da vida. Coloquei minhas roupas e voltei pra área das pessoas vestidas com algumas grandes lições. Respeitar a nudez alheia, do tamanho que ela for. E aprender vestir-se com a mesma rapidez e facilidade com a que você tira a roupa. Danke, Munchen.
Fim da sessão.
Fotos: Daniel Fama – Mostra Fotográfica “[Nu] objeto”
Raul Guilherme Urban
Antônia,
sou nudista desde a adolescência e não abro mão disso, apesar de a família não tomar parte dessa predileção. Hoje tenho 71 anos, casado há 45, mas a nudez sempre me acompanhou, sem receios ou preconceitos. Amo ficar nu em casa, sempr que possível, mas apenas em companhia de minha parceira. Ou, então, quando ewstou só, mergulhado nos meus trabalhos de documentários históricos. Existe algo mais libertário (e sensual) que a nudeez em pelo? Ainda mais em pleno calor do verão aqui no Sul! Ah, teu escrito me motiva para, sempre, me livra das incômidas roupas. Estou pronto para diálogos. Abraço.
Dai
Hahaha que ótimo!!! Quando fui à Munique estava frio e chovendo, nem chegamos perto do parque para poder ter essa experiência que, confesso, meu marido tem muito mais entusiasmo do que eu hehe
Thaiza
Kkkkkkkkkkkkk morri!!! Adoro, Antônia!
Antônia no Divã
Volte sempre, Carla.
Carla Dias
um dos textos mais legais que ja li em terras virtuais. Agradeco a amigona Priscila Dexheimer por ter postado o “launch” do seu blog. Ganhaste uma fã!