Suspiros

7 segundos

em
19 de julho de 2016

Eu tenho uma obsessão por momentos que desafiam as métricas do relógio. Sabe, aqueles instantes cujas emoções são tão intensas, as expectativas tão palpáveis, que o tempo parece desacelerar? Eu vivo por momentos assim. Guardo-os todos em caixinhas estofadas do meu coração, como recordações das mais queridas. Adoro quando as borboletas na minha barriga alçam voo e me fazem levitar por alguns segundos nesses recortes da vida real. Eu corro o tempo todo, mas em raros momentos da vida, eu tomo o meu tempo vendo ele se arrastar, deliciosamente. Dentre os meus preferidos… aqueles preciosos 7 segundos antes de beijar alguém pela primeira vez.

A principio 7 segundos não parecem nada. Presumo que nada de relevante possa ser efetivado em tão pouco tempo. Mas aqueles 7 segundos efervescentes entre uma boca e outra, esses sim, podem ter a magnitude de 7 horas, 7 dias. É neste pequeno intervalo de tempo que o rosto chega tão perto de outro rosto, que é possível sentir o cheiro da pessoa pela primeira vez. E aqui não estou falando sobre perfume, desodorante, ou pós-barba. É o cheio do beijo da pessoa. Uma mistura que pode variar um bocado, entre um chiclete furtivamente adicionado, prevendo o encontro dos hálitos. Ou o gosto de cerveja, de vinho, de café, de chocolate, o gosto de alguém. É a química do beijo sem beijar. Um perfume quente e intenso que vem da boca, e aquece o momento antes mesmo dele começar.

Durante estes rápidos e longínquos movimentos dos ponteiros, é quando acontece o posicionamento das mãos, prevendo a moldura do beijo. Moldura que normalmente é feita através de um abraço, um entrelaço. É claro que essa dança começa muito antes dos 7 segundos, com toques suaves aqui e ali, sorrisos convidativos, um caminho a ser sutilmente tateado.  Uma mão nas costas, ou na cintura. Talvez um joelho tímido encostado no outro, testando a permissão, aproximação, o aconchego. Não gosto do “chegar-chegando” de supetão. Gosto de toques que pouco a pouco se constroem, se permitem, se enroscam. Adoro lugares com música alta que possibilitam cochichos no ouvido, completamente justificáveis. Musica alta é a desculpa perfeita para chegar mais perto da orelha, aquela que fica tão perto do pescoço. E o pescoço é um ótimo lugar para iniciar a jornada dos 7 segundos.

Nesta fração de tempo, os olhares ficam perdidos, entre boca e outro par de olhos. É tempo suficiente para não ser uma intimada, mas longo o bastante para confirmar o interesse. Gosto quando os olhos avisam gentilmente que o melhor está por vir. Carregados de excitação pela novidade, e a confiança de que beijo na boca tende a ser sempre bom. Eu adoro olhares pré-primeiro beijo. São confusos, e atrapalhados, mas ao mesmo tempo seguros do objetivo comum. Gosto do leve ar de embriagados que estes olhos têm, de quem está louco para matar a sede no outro. Piscadelas, olhares 43, cílios tocando no famoso “beijo de borboleta”. São as janelas da alma gritando “vai acontecer” ou pedindo “chega mais perto”. A respiração acelera, o coração sapateia.

Esses 7 segundos são o mais puro estado de graça. Talvez porque ali as expectativas estejam intimamente ligadas com o presente. Neste pedacinho de tempo, ninguém está preocupado com os beijos do passado que acabaram em corações partidos, ou tão pouco se o beijo em questão será a última boca a ser beijada antes do “felizes para sempre”. Não. 7 segundos antes de um beijo é o mais próximo de estar presente em um momento. É quase um execício de meditação, de inspiração e expiração, antes de chegar a nirvana, aquele estado transcendente onde você é liberado de todos os efeitos do karma e  do senso de si…

7,

6,

5,

4,

3,

2,

1.

E o melhor está por vir. Fim da contagem. Fim da espera. Fim da expectativa.

Fim da sessão


Ps: Hoje a sessão foi curtinha. Porque alguns momentos da vida não precisam de muito para se eternizarem.

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8 Comments
  1. Responder

    Paula Armada

    20 de julho de 2016

    Sabe que toda vez que recebo a notificação de novos textos, fico feliz? Tenho a certeza de que vou ler algo maravilhoso e nunca, absolutamente nunca, me decepciono! Parece sempre a releitura de algo que sinto ou já senti, em uma perspectiva que nunca consigo colocar em palavras!

    • Responder

      Antônia no Divã

      20 de julho de 2016

      Aiiiiiii! Não sei do que gosto mais, se das minhas leitoras queridas, ou de beijo na boca. Acho que não vivo mais sem os dois! <3

  2. Responder

    Flávia

    20 de julho de 2016

    Adorei o texto …tenho acompanhado e amado seu trabalho …esses 7 segundos me fizeram viajar …que delícia !!

    • Responder

      Antônia no Divã

      20 de julho de 2016

      Miga, sua loca, beija muito! Viaja muito! smack

  3. Responder

    Izabela

    20 de julho de 2016

    Oi Antônia.
    Lindo texto. Acompanho seu blog e amo de paixão.
    Também escrevo sobre a vida. Questão de sobrevivência.

    Parabéns.

    • Responder

      Antônia no Divã

      20 de julho de 2016

      Oi Iza! Somos duas sobreviventes pela escrita. Tipo oxigênio! Obrigada pela mensagem! Beijocas

  4. Responder

    Natália Lima

    19 de julho de 2016

    Nossa, ameeei esse texto, me fez lembrar muito dos “7 segundos” que eu tive com alguém muito especial pra mim. Sério você tem a obrigação de nunca parar de escrever hahaahaha. Obrigada pelo texto e por me trazer de volta a emoção desses “7 segundos” que vale a pena e muito lembrar (=

    • Responder

      Antônia no Divã

      20 de julho de 2016

      aiiiiiiiiiiiiiiiieee, que delicinha de comentário! <3

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Aline Mazzocchi
No divã e pelo mundo

De batismo, sim, Aline. Mas eu precisei do codinome Antônia - do latim "de valor inestimável" - para dividir minhas sessões públicas de escrita-terapia. O que divido aqui é o melhor e o pior de mim, tudo que aprendi no divã e botando o pé na estrada. Não para que dizer como você deve ver a vida. Mas para que essa eterna busca pelo auto-conhecimento, não seja uma jornada solitária, ainda que pessoal e intransferível. Então fique a vontade pra dividir o divã e algumas boas histórias comigo. contato@antonianodiva.com.br

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