Efemérides

Abundância

em
6 de dezembro de 2016

Dia dessas uma amiga minha falava sobre o poder da abundância, e eu ouvia calada com certo ceticismo. Eu odeio quando sou cética frente a estes movimentos mais humanos, mais otimistas. Normalmente eu sou uma otimista. Entretanto, por vezes eu perdoo a minha falta de fé, afinal, fomos treinados para competir, muito mais do que para colaborar.

Nós aprendemos bem cedo que tudo tem que ter uma razão, uma agenda oculta ou uma recompensa: “Coma o seu jantar direitinho, e você ganha sobremesa”. Claro, a gente está ocupado demais para explicar as nossas crianças que elas tem que atender às demandas sem um prêmio no final. A gente quer que eles comam e pronto. “Trabalhe duro e atinja o sucesso”, escutamos a vida toda, e cresce mos esquecendo de pensar o que de fato é sucesso, e logo conectamos sucesso e resultado à dinheiro, e tudo vira uma corrida por grana.

Bem, voltando a minha amiga, ela andava vivendo um momento mais otimista que o meu. Contou-me que andava entregando energia a outras pessoas, sem pensar muito em ser beneficiada na troca. Dava aulas de coaching, consultorias, sem muito apego com o retorno objetivo das suas ações. Claro, ela também se preocupava com dinheiro, afinal, ainda não sobrevivia de amor – pagar a luz exigia reais no bolso, impreterivelmente. Mas ainda assim apostava numa aventura de que, eventualmente, toda a sua benfeitoria acharia o caminho de volta para casa.

Em poucos dias neste modus operandi, ela havia conseguido acesso a inúmeras pessoas, que como ela, a ajudaram de bom grado. Algo atípico que só o universo manda, como receber um atendimento de um topógrafo que tem noções de Feng Shui, de graça, para o seu novo empreendimento. Um profissional extremamente específico, que era exatamente o que ela andava buscando. ”Abundância, Antônia. Confia, promove e deseje abundância”.  E como eu nunca formo uma opinião sem botá-la para teste, lá fui eu promover a abundância.

Entreguei meu tempo, ouvidos e energia a projetos que não necessariamente tinham uma remuneração envolvida. Respondi a pedidos de conselhos que estavam parados na minha caixa porque eu não tive tempo de respondê-los. Não respondi com conselhos, mas com aquela frase mágica que diz “eu estou aqui para você”, que por si só, já opera milagres. Tirei tempo para ouvir meus amigos que precisavam de um café e um ombro reconfortante. Parei tudo que eu estava fazendo e dei atenção carinhosa e comprometida a uma palestra para a qual fui convidada, e que trazia em sua programação pessoas bem mais fodas que eu. Não me preocupei em competir – ou me comparar – que é uma tendência horrível que eu tenho. Preocupei-me em somar. Ouvi o tal do “flow” e deixei rolar.

O que veio a seguir foi nada menos que uma enxurrada de abundância. Na cabeça.  Aquela palestra que eu entreguei de peito aperto, foi abraçada por lágrimas, risadas e braços. Muitos abraços. Recebi histórias de pessoas que foram tocadas pelas minhas palavras, e acariciei não o meu ego, como poderia ser o caso, mas o meu propósito. Vi de perto as lágrimas de um Amyr Klink emocionado (e quando um cara que cruzou os mares a remo se emociona, você PRECISA se emocionar junto!). Recebi convites. Pessoas me ofereceram seus serviços, suas recomendações. Ganhei livros, contatos. Tudo de forma genuína. Despretensiosa. As pessoas seguiram me oferecendo carona nas horas que eu mais precisava, ou me entregando recursos sem eu nunca ter pedido.

Abundância. Entretanto perceba que a abundância é algo como o oxigênio. Você se acostuma e passa a não perceber mais a sua presença. A menos que pare, fique alerta e a reconheça – da mesma forma como é feito com o oxigênio através da meditação e a arte de respirar.  É preciso inspirar e expirar abundância para senti-la inflando o peito. A falta da abundância, essa sim é percebida rapidamente, nos momentos em que perdemos o ar. A falta de sorte, de ajuda, de fé.

Na semana seguinte ao meu momento de contemplação da abundância, tive dias mais desafiadores. Quase fui assaltada por um cara com uma faca, não fosse as minhas lágrimas de desespero e meus suplícios de ”por favor, não”. Ele me deixou ir embora, ilesa e com todos os meus pertences, levando apenas a minha tranquilidade. Daí veio a tragédia com a Chapecoense e eu revisitei aquele momento de contemplar a falta de sentido. Quinta-feira acordou atrapalhada, e ao pegar um Uber, o motorista erra o caminho e acaba preso em meio a um estacionamento de taxistas furiosos com o Uber. Fomos hostilizados e eu sai correndo, temendo que minha sorte tivesse chegado ao fim. Na sexta ao me deslocar de novo de Uber, uma van comercial colide bem na lateral que eu estava sentada. Nada de grave, apenas burocracia e espera. No domingo um amigo me ofereceu uma carona para um evento do meu trabalho. Na volta o carro dele entrou em pane completa e nunca mais ligou.

Aí você está pensando, cadê a abundância?

Acontece que quando percebi cada um dos meus infortúnios da semana passada, eu estava alerta às boas ondas que eu andava surfando. Eu agradeci por nada cruel ter me acontecido. E mesmo quando a tragédia bateu a porta de todos nós, me preocupei em agradecer que em meio a tantas perdas em Medellín, houve aqueles que se salvaram. Eu chorei pelas vidas que se foram. Mas sorri para o milagre dos que ficaram. Quais as chances disso acontecer?

E essa é outra das qualidades da abundância. Ela te ensina o poder da gratidão. E não gratidão desta moda facebookiana de enfiar essa palavra sem menor sentido ou contexto para soar cool ou meter um namastê qualquer porque você fez duas aulas de yoga. Gratidão na qualidade de ser grato, de reconhecer a grandeza do que lhe é ofertado, daquilo que é protegido, engrandecido.

Eu sei que passamos todos por período de escassez. De falta de fé. Mas estou aprendendo cada vez mais que precisamos começar a enxergar a abundância que nos rodeia. E entregar a abundância de bom grado. Percebê-la operando não como moeda de troca, mas moeda de valor. Que não representa uma economia exata, mas há indícios de que ela saber ser justa. Conheço gente com menos recurso que eu, que não sorri pra vida. Já lidei com pessoas que serão sempre pobres por carregar uma pesada e descomunal pobreza de espírito. A riqueza está em reconhecer a abundância que oferecemos e que nos é ofertada.

E eu sou grata pela abundância da qual eu gozo. Não trocaria de lugar nem com tio Patinhas.


Fim da sessão.

Palavras-Chave
SESSÕES RELACIONADAS
Todo mundo precisa de um terapeuta
Todo mundo precisa de um terapeuta

29 de setembro de 2020

muito disponível
Muito disponível

22 de setembro de 2020

O porquê das histórias…

17 de abril de 2020

2 Comments
  1. Responder

    katianeflores

    3 de janeiro de 2017

    Linda reflexão mesmo, é bom trazer esse tipo de coisa para o dia a dia, muitas vezes fazemos isso acabamos esquecendo é um exercicio e como tal precisa ser praticado diariamente para ser aprendido e virar habito!

  2. Responder

    Ju Strey

    6 de dezembro de 2016

    Simplesmente linda reflexão! Gratidão por compartilhar essa experiência!

DEIXE UM COMENTÁRIO

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Aline Mazzocchi
No divã e pelo mundo

De batismo, sim, Aline. Mas eu precisei do codinome Antônia - do latim "de valor inestimável" - para dividir minhas sessões públicas de escrita-terapia. O que divido aqui é o melhor e o pior de mim, tudo que aprendi no divã e botando o pé na estrada. Não para que dizer como você deve ver a vida. Mas para que essa eterna busca pelo auto-conhecimento, não seja uma jornada solitária, ainda que pessoal e intransferível. Então fique a vontade pra dividir o divã e algumas boas histórias comigo. contato@antonianodiva.com.br

PESQUISE AQUI